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Às Cavalitas do Vento

Seg | 24.06.19

Páginas Salteadas | Scones de queijo e alecrim de Eleanor Oliphant

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“No final, o que realmente importa é isto: eu sobrevivi.”

Uma passagem que poderia perfeitamente resumir a crua, desajustada, inconstante, imprevisível, comovente e desarmadamente humana história de Eleanor Oliphant, a protagonista de “A Educação de Eleanor”, obra de Gail Honeyman, vencedora do Costa First Novel Award 2017 para melhor romance de estreia e dos British Book Awards para Livro do Ano, e ainda estrela da Feira do Livro de Frankfurt em 2015.

Com subtileza e sarcasmo, e uma secura (ou arquivo de vida) que coloca o dedo na ferida, o aguçado humor britânico percorre esta narrativa relatada na primeira pessoa, que se assume tão agridoce como as relações humanas e a existência em si mesma. E penso que acaba por ser nesse sentido que a tradução portuguesa de um título tão bem deslindado, “Eleanor Oliphant is Completly Fine”, acaba por não absorver e extravasar a complexidade da personagem, ela que se convence de que está realmente bem e que só precisa do necessário, sem espaço para o extraordinário e para a visibilidade; tudo porque vela, sem se aperceber, um trauma de infância profundo, uma ausência de colo e de calor, uma inaptidão social, uma solidão barulhenta e uma dependência narcótica. Há uma tortura pulsante na sua realidade e nas suas cogitações, que pesa e extenua – e a páginas tantas só queremos que Eleanor encontre a acalmia que tanto anseia. 

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No nosso primeiro encontro, à média luz, não senti empatia pela contabilista que leva uma vida rotineira, fazendo um horário à secretária das 9h às 17h puramente burocrático, ficando em casa às sexta-feiras à noite com a sua fatia de pizza e a garrafa de vodca do supermercado (o Tesco é uma referência constante na trama) e vasculhando as redes sociais da sua suposta “alma gémea”, o vocalista de uma banda que viu atuar num pub, numa das suas poucas saídas espontâneas. Talvez por, erro meu (talvez!), ficar sempre de pé atrás quando me deparo com a palavra bestseller na capa, mas também porque considero que os primeiros capítulos menos intrincados, mais superficiais. Mas a Eleanor trocou-me as voltas, desamparou-me e fascinou-me, e a verdade é que ela é tudo menos simples. Conquistou-me com as suas cicatrizes, a sua estranheza, a sua excentricidade, as suas manias, a sua loucura e a sua honestidade; vinculei-me a ela emocionalmente, deixei-a estranhar-se em mim e encantar-me, já que também eu fui, muitas vezes, uma inadaptada. Foi brisa amena e vulcão, prisão e despedida, ficção e feitiço, demência e cura, morte e renascimento. E grata lhe fico por me relembrar o quão importante é a despreocupação em relação ao que os outros pensam relativamente ao que dizemos ou fazemos, para que possamos privilegiar a nossa saúde mental.  

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Tudo muda quando o seu caminho se cruza com Raymond, o técnico de informática do escritório onde trabalha, e Sammy, um idoso que desmaia no meio da rua, eles que são duas das personagens secundárias mais doces e generosas que já tive o prazer de conhecer. É também graças a estas duas amizades improváveis que descobre novos prazeres na gastronomia, nomeadamente o conforto de uns scones de queijo e de um café repleto de espuma. Nesta receita de junho do Páginas Salteadas, quis oferecer-lhe, uma vez mais, este deleite que encontrou tardiamente, mas que chegou a tempo de acalmar a sua mente e o seu coração, afastando-a de todos os fantasmas do passado, mas, coincidentemente, recebendo-a no meu Ninho com os apontamentos e os coordenados peculiares da sua casa. Para acompanhar? Alive and Kicking e Let There Be Love, dos escoseses Simple Minds, a banda sonora que me acompanhou durante esta leitura. E querem saber qual o detalhe que me sensibiliza e oferece esperança no que ainda está para vir? A autora Gail Honeyman tornou-se escritora a tempo inteiro aos 40 anos! 

Scones de queijo e alecrim
[inspirados no livro "A Educação de Eleanor", de Gail Honeyman, editado pela Porto Editora]

Ingredientes
Sal q.b.
1 ovo [Matinados]
1 pitada de Noz-moscada
1 colher de chá de fermento em pó
300 gramas de farinha sem fermento
Bebida de aveia (para pincelar) [Oatly]
Sementes de sésamo branco biológicas
2 raminhos de alecrim picados [Vitacress]
1/2 de um copo de leite sem lactose [Asana]
150 gramas de queijo Emmental ralado [Auchan]
Sementes de sésamo preto biológicas (para decorar)
90 gramas de manteiga [Becel Cozinha 100% ingredientes vegetais]

Ao jeitinho do Ninho do Vento
Tal como Eleanor Oliphant, o modo de confeção desta receita é simples e prático. Numa taça, adicionem a farinha sem numa taça com a manteiga, o sal e o fermento em pó. De seguida, coloquem as mãos na massa e envolvam a mistura, até os ingredientes vos parecerem homogéneos. Adicionem o queijo Emmental, as sementes de sésamo brancas, uma pitada de noz-moscada e o alecrim picado; revolvam uma vez mais. Agora, acrescentem o leite e o ovo, previamente batido num recipiante à parte. Moldem a vossa massa, como se estivessem a construir figuras desajustadas de plasticina. Limpem a vossa bancada ou mesa de cozinha e polvilhem-na com farinha. Prontamente, estendam a vossa amálgama desigual de aromas, sabores e texturas, conferindo-lhe 1 cm de altura. Se tiverem um cortador de bolachas redondo, utilizem-no para dar forma aos vossos scones - mas, caso não tenham este utensílio, podem sempre recorrer a um copo com gargalo mais amplo. Depois, revistam o tabuleiro com uma folha de papel vegetal, para poderem levar estes típicos bolinhos britânicos ao forno. Disponham os círculos de massa, pincelem com bebida vegetal (neste caso, optei por aveia) e decorem com sementes de sésamo preto, que tem um sabor suave, um tanto ou quanto semelhante ao da noz. Logo após finalizarem o processo de confeção, levem ao forno pré-aquecido a 220ºc durante 10 a 15 minutos, consoante a potência do vosso equipamento. Convidem o Raymond da vossa vida e sirvam os vossos scones com doce de arando, um sabor que me transporta sempre para Terras de Sua Majestade, ou [a minha] compota de morango, noz-moscada e tomilho-limão com um café preparado à moda antiga. 

Acompanhem as receitas das bloggers do projeto Páginas Salteadas:
Vânia Duarte, Lolly Taste
Catarina Sousa, Joan of July
Andreia Moita, Andreia Moita Blog

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